segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

O3 ▬ O que se tornou realidade.


Bree continuou imóvel e eu igualmente. Aquela ameaça pareceu real e, mesmo se estivesse errada, eu não cometeria qualquer erro impensado que tirasse minha vida. Apesar disso, eu o fuzilava com meus olhos. Não era possível que aquela criatura insensível estava sentada ali, tão perto. Ele parecia estar pensando em algo – ou talvez planejando seu ataque. O estranho era que o garoto adolescente ainda continuava a nos encaras, mais precisamente, a encarar o cara dos sonhos.

- Qual seu nome? – Tentei improvisar, com o medo tomando conta de minha voz. Quis fazer qualquer coisa que pudesse me liberar daquilo.

- E interessa? – Ele respondeu de maneira rude, logo mudando seu tom. – Erik.

Erik. Então o nome do assassino era Erik. Quem ouve esse nome nem desconfia de nada, tão simples e aparentemente inocente.

Eu tentaria distraí-lo mais, se não fosse pela ação do adolescente que estava nos observando até então. Ele viera caminhando a passos curtos até nos, sem ninguém perceber, e golpeara Erik com um chute certeiro em seu tórax, que foi tão forte que fez Erik atingir a parede atrás de nós. Não satisfeito, o garoto pulou sobre nós e o atingiu mais uma vez, deixando-o incapacitado de se levantar.

Então, aconteceu o que eu mais temia. O garoto veio determinado em nossa direção. Tentei correr, levando Bree junto comigo, mas aconteceu exatamente o que ocorrera no meu primeiro sonho, ele nos alcançou rapidamente e nos fez parar. Bree chorava incontrolavelmente enquanto eu só conseguia pensar no meu sonho e se ele poderia se tornar real.

- Olá, Summernight. Aliás, que nome incomum. – O garoto tocou meu rosto com aquelas mãos repugnantes. – Passei o dia inteiro lhe observando e aposto que você nem notou.

Observando-me? Então as lágrimas, já gastas de tanto uso em um só dia, caíram novamente. Que espécie de ser era aquilo? E o que queria comigo?

- Fale alguma coisa. Não vai querer dizer nada antes de... – Ele não chegou a completar sua frase cheia de zombaria. – Não é?

- O que você quer de mim? Deixe-me em paz! – Tirei sua mão imunda do meu rosto.

- O que eu quero? Simplesmente você.

E a cena em que eu morria no meu sonho estava se repetindo, só que com um assassino diferente dessa vez. Ele estava se aproximando cada vez mais e a única coisa que eu consegui fazer foi cerrar meus olhos e gritar internamente para que esse dia fosse realmente um sonho.

Estranhei a demora demasiada do ataque e arrisquei abrir os olhos. A cena que eu vi em seguida foi, no mínimo, tão horrível e nojenta que fez meus joelhos fraquejarem. O garoto, que estava preste a me matar, jazia no chão com seu maxilar arrancado e com seus olhos já sem vida. Erik estava em pé poucos metros a minha frente, ofegante.

- O que aconteceu? – Minha voz estava histérica e saia aos gritos.

- Nada que eu já não cogitava antes. Droga... Você está bem?

- Sim, eu acho. – A realidade começava a iluminar minha cabeça e eu voltava a pensar claramente. – Onde está Bree? Se você fez alguma coisa com ela, eu juro que...

- Calma! – Interrompeu-me ele. - Ela fugiu antes de eu recobrar a consciência.

Sem conseguir falar mais, continuei no chão ao lado do meu assassino morto. Ainda chorando, eu não conseguia desviar meu olhar do maxilar que estava onde antes o garoto me observava. Eu já aceitava o fato de que o dia mais bizarro da minha vida infelizmente não era mais um dos meus sonhos, era real.

E se os outros dois sonhos também fossem reais ou algum tipo de premonição? E se a mãe e seu filho estivessem verdadeiramente mortos? E pior, mortos por aquele que acabara de me salvar!

- Venha. Vamos para um lugar mais... Confortável.

Eu comecei a entrar num estado de choque e estava precisando me sentir segura. Inconscientemente, eu segui os passos de Erik.

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

O2 ▬ Os conflitos internos.


Abracei-a fortemente e despejei minhas lágrimas até conseguir me controlar e contar-lhe a história, não antes de sentarmos em um dos bancos daquela rua, um banco rústico de madeira velha e desgastada, dando um ar de antiguidade àquele lugar.

- Eu não sei ao certo o porquê de eu estar assim, Bree. Estou aqui em Seattle com meus pais, você sabe que eles adoram viagens, principalmente vir para essa cidade. E isso tudo começou nessa mesma noite.

Eu parecia estar ansiosa para contar-lhe a história. Não consegui guardá-la somente para mim, precisava me abrir com minha melhor amiga, em que confiava. Respirei fundo e passei a mão em meu pescoço, um costume que eu tinha desde criança.

- Eu estava dormindo no meu quarto de hotel até que comecei a sonhar. Foi muito estranho, muito mesmo. Na verdade, foram dois sonhos, um deles aconteceu há uns minutos atrás. Sonhei com uma criatura, não consegui ver o que era, mas poderia ser um homem, era muito parecida com um. Enfim, no primeiro sonho, eu estava sozinha num beco muito escuro, e a tal coisa barrou meu caminho, mas quando ele começou a se aproximar de mim – provavelmente para me matar – eu acordei. No segundo sonho, eu observava uma mulher brincando com seu filho, ao qual eu havia visto pouco antes, e ele matou o garotinho e sua mãe. Como? Eu não sei lhe dizer. Nunca consigo ficar até o fim para ver o que acontece em seguida.

Quando havia acabado de narrar meus dois sonhos, percebi que estava com lágrimas caindo novamente por meu rosto.

- O que será isso, Bree? Ajude-me, estou tão assustada.

E realmente eu estava assustada. Estava certa de que eu só poderia estar tendo um surto psicótico. Não era normal uma pessoa ficar tão apavorada por causa de um simples sonho. Não, aquele sonho não era simples. Parecia ser tão real. Eu podia ver claramente cada detalhe dos lugares, das feições da mãe e de seu filho. Podia até sentir o aroma que a criatura liberava.

Perdendo-me em meus pensamentos, percebi um leve movimento na rua. Já havia anoitecido! O dia passou tão rápido, nem notei. A rua estava praticamente deserta, a não ser pelo garoto, aparentemente adolescente, que eu acabara de avistar encostado numa das paredes de um antigo edifício, com suas paredes descascadas e sua pintura já sem cor.

Ele cumprimentou-me cordialmente com um ‘Olá’. Respondi da mesma maneira, cordialmente. Mas ele não teve chance de continuar sua conversa, uma outra pessoa – dessa vez um homem encapuzado, onde não pude ver seu rosto – aproximava-se de nós duas. Chegando cada vez mais perto, ele retirou seu capuz e encaminhou-se ao lado de Bree para sussurrar ao seu ouvido. Não queria, mas não pude evitar ouvir o que o mesmo disse, já que eu estava muito próxima de minha amiga.

- Se quiser continuar viva, não faça escândalo.

Após suas palavras serem proferidas, fiquei um pouco alerta. Eu reconhecia aquela voz, mas não lembrava de onde. E as palavras que saíram de sua boa, o que ele queria dizer com aquilo? Logo, postou-se ao lado dela e sorriu para mim, deixando sua face à mostra. Retribuí o sorriso, mas não por muito tempo, até fechar minha feição. Não podia ser, eu sabia quem ele era. Nunca o vira realmente, mas sim, nos meus sonhos, nos meus últimos dois sonhos. O reconheci por seu olhar, seu olhos grandes e intensos, que me miraram na hora de minha morte que não chegou a ser executada. Aquele sorriso, exatamente o mesmo que eu havia recordado, seus dentes branquíssimos e perfeitamente alinhados. E finalmente me lembrei de sua voz, a mesma que me disse ‘acalme-se, estou só fazendo o necessário’. Não! Aquilo não era necessário. Não era necessário matar pessoas inocentes, crianças indefesas!

Com medo, não pronunciei em volta alta a minha revolta interna, não me parecia coerente numa hora dessas. E se eu estivesse errada? Se ele fosse só mais um amigo de Bree? Ou talvez até um desconhecido que veio flertar conosco? Eram hipóteses a serem levadas em conta.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

O1 ▬ Os sonhos.



Eu estava caminhando por um beco totalmente escuro, deviam ser três horas da manhã aproximadamente, pela posição da Lua. Eu olhava freneticamente para os lados, fugindo de algo que eu não sabia o que era, mas sabia que era perigoso. Mortal – essa palavra veio na minha mente enquanto eu corria para fora daquele beco. Mas não fui bem sucedida, quando estava quase na rua principal, um vulto passa velozmente ao meu lado e pára à minha frente, bloqueando meu caminho. Parecia ser um homem, mas estava com o rosto completamente encoberto por um longo capuz preto, e eu não conseguia identificá-lo. Ele respirava calmamente, contrastando com minha respiração alta e ofegante. Tentei passar por ele, mas era impossível, ele era rápido demais. Ele levou sua mão ao meu ombro e começou a se aproximar. Queria me afastar, mas suas firmes mãos não me deixavam e ele tocou seus lábios nos meus. Afastou-se de mim e abriu um leve sorriso, deixando a mostra seus dentes perfeitamente brancos. Sua feição de repente transformou-se de agradável para perversa e ele aproximou-se novamente de mim, dessa vez mais rápido e...

Acordei dando um grito e levantando em um pulo da cama. Eu havia transpirado bastante durante esse pesadelo. Agradeci por ter ficado inacabado, mas fiquei um pouco curiosa para saber o que aconteceria em seguida. Decidi tentar esquecer aquelas cenas e fui tomar um banho para esfriar um pouco a cabeça. Durante o banho ainda fiquei pensando no pesadelo e tentando imaginar diferentes formas de como teria acabado, algumas felizes, outras nem tanto.

Após terminar o banho, vesti algo confortável, como sempre, e saí de casa a fim de dar uma volta de carro pela cidade onde eu estava passando o final de semana, Seattle. Meus pais sempre iam uma vez por mês para aquela cidade. Não sei o motivo, mas eles adoravam lá e, de certa forma, eu também. Enfim, aquela cidade fazia eu me distanciar do meu mundo real, de Chicago, onde eu era uma garota normal. Inteligente, mas não nerd, sempre rodeada de amigos, mas não popular. Como eu já disse, era normal. Entrei no meu carro, um simples modelo popular, e fui ao centro da cidade caminhar um pouco. Olhei a muitas vitrines que chamavam a atenção e comprei algumas coisas de que eu estava precisando. Tantas distrações, mas o sonho - pesadelo – ainda continuava em minha cabeça. Volta e meia, enquanto eu comprava algo ou observava as vitrines, vinham ‘flashbacks’ do beco, ás vezes algumas cenas novas, mas geralmente não muito interessantes. Entrei numa loja de presentes e achei algo que seria perfeito para dar a uma das minhas amigas, a que mais se identificava comigo, a Bree. Não era nada muito caro, mas era delicado como ela, e também muito lindo. Era uma caixinha de jóias, de madeira maciça e toda trabalhada. Achei-a linda.

- Embrulhar para presente? – Perguntou-me a balconista.

- Sim, num papel bem bonito, por favor.

Após a caixinha ter sido embrulhada, voltei para meu carro. Eu havia ficado um pouco cansada de tanto caminhar naquele dia e já estava entardecendo. Fiquei a observar as pessoas caminharem, até que uma mãe, brincando com seu filho, prendeu minha atenção. Ela estava tão amorosa, parecendo tão protetora, tão... Então peguei no sono, e o sonho voltou novamente, mas dessa vez diferente, muito mais resumido. E junto vinha a cena da mãe que eu observava.

O homem chegava perto de mim e mordia levemente meu pescoço, até que senti seus dentes perfurarem minha pele e sangue começar a escorrer pelas fissuras. De repente, a cena mudou, eram a mãe e sua criança brincando juntas, abraçadas. Mas não estavam naquela mesma rua onde eu as observava, estava num quarto grande e ensolarado, onde logo anoiteceu e as duas adormeceram juntas. Cheguei mais perto e pude observar os traços do rosto da mãe. Eram bonitos, uma beleza comum, cabelos castanhos ondulados, com algumas mechas em seu rosto de pele cor de oliva, sua boca com um traço fino estava relaxada em seu sono leve. A criança, um menino realmente pequeno, uns dois anos eu daria, com um rostinho angelical, dormia profundamente nos braços de sua mãe. Até que todo o cenário mudou repentinamente, como em um sonho – era um sonho, ou melhor, estava se tornando mais um pesadelo. A mulher estava com a expressão extremamente aterrorizada enquanto olhava para um ponto fixo ao chão. Segui seu olhar e me deparei com o garotinho, tão lindo, jogado ao chão, durinho como uma pedra e sua pele um pouco enrugada. Cheguei mais perto e toquei sua face, mas ele não respirava. Ele estava morto. Morto! Lágrimas começaram a escorrer de meus olhos naquele instante, até eu ouvir um grito. Era ela, a mãe. Algo ou alguém estava em cima dela, como se a estivesse beijando. Mas eu sabia que não era isso. Aquilo estava fazendo o mesmo que faria comigo no meu sonho passado, ia matá-la assim como fizera com seu filho. Eu não poderia suportar, não poderia ver os dois mortos por aquela criatura, que eu não sabia o que era. Tentei me mexer para defender a mãe enfraquecida, mas eu não conseguia, estava imóvel. Droga! Tenho que defendê-la. Consegui correr e dei um soco na criatura, mas não adiantou...

Acordei desnorteada novamente, dando um soco no próprio volante do meu carro, acionando a buzina. Olhei para todos os lados procurando a mesma mãe com seu filhinho, mas nada. Ela não estava ali. Será que eu estava imaginando coisas? Será que tudo isso, os pesadelos, as compras, tudo não era apenas um sonho? Não, não era. Eu estava lúcida demais para ser um simples sonho. Então só podia estar enlouquecendo. Não eram normais meus sonhos.

Fui caminhar um pouco para esfriar a cabeça. As lágrimas do sonho ainda escorriam por meus olhos e as pessoas por que eu passava me olhavam com estranheza. Elas não podem ficar sem se meter na vida dos outros? Metidas! Andava cada vez mais rápido, tentando fugir daqueles olhares, até que esbarrei em alguém. Eu já ia começar a xingar, mas quando olhei para seu rosto, percebi quem era. Era minha amiga, Bree. Que coincidência encontrá-la em Seattle.

- Bree, você por aqui? – Eu disse enxugando minhas lágrimas, não queria que ela me encontrasse naquele estado.

- Sim, mas o que aconteceu com você Summer? – Ela colocou uma de suas mãos no meu rosto.

- Nada, é uma história muito estranha.

Meus olhos encheram-se de lágrimas novamente ao lembrar da cena do garotinho morto, jogado ao chão. Não me contive e abracei Bree, eu estava precisando de colo naquele momento. Eu estava atordoada, indecisa, com medo, confusa. Muitos sentimentos enrolados em minha cabeça. O que eu faria? Será que esse sonho que vem se repetindo quer dizer algo? Acho que não.

 
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